24
- abril
2017
Rajoy viaja ao Brasil para incentivar a participação de empresas espanholas em seu plano de privatizações

Primeiro-ministro vende suas conquistas econômicas na América enquanto tem problemas com a corrupção na Espanha

O primeiro-ministro da Espanha Mariano Rajoy viajou neste domingo a Brasília, na primeira etapa de uma viagem latino-americana que se encerrará na quarta-feira em Montevidéu (Uruguai). O objetivo dessa turnê pela região é revitalizar a relação estratégica com o gigante sul-americano e incentivar a participação de empresas espanholas na nova rodada de privatizações colocada em andamento pelo presidente Michel Temer.

Rajoy, que prometeu apoiar financeiramente os investimentos espanhóis, encerrará na segunda-feira em São Paulo. Na capital econômica do país, o primeiro-ministro terá uma reunião com executivos de mais de 150 empresas dos dois países, incluindo os principais responsáveis da Iberia, Telefónica, Indra, Navantia, Abertis e Repsol, que acaba de anunciar um recorde de sua produção no Brasil, com mais de 55.000 barris equivalentes de petróleo e gás por dia.

A Espanha é o terceiro maior investidor no Brasil (atrás dos EUA e da Holanda), com um saldo acumulado de mais de 47 bilhões de euros (148 bilhões de reais), e o Brasil é o terceiro maior destino dos investimentos espanhóis no mundo, atrás dos Estados Unidos e do Reino Unido. Mas os investimentos espanhóis diminuíram durante a crise e o intercâmbio comercial, de pouco mais de 5 bilhões de euros anuais (16 bilhões de reais) – o que coloca a Espanha como o sétimo fornecedor e o quinto maior cliente do Brasil na UE – ainda está muito longe de esgotar suas possibilidades.

Com sua primeira grande viagem pela América Latina nesse mandato, Rajoy colocou um oceano de distância entre os casos de corrupção que o perseguem na Espanha. Após uma das semanas mais complicadas de seu mandato – com sua citação como testemunha no julgamento do escândalo Gürtel, a prisão do ex-governador madrilenho Ignacio González e a caída em desgraça da incansável Esperanza Aguirre – chegou a Brasília disposto a esquecer esses problemas e difundir os sucessos econômicos de seu governo. Uma mensagem que cai como uma luva para seu anfitrião, cujo programa se parece como uma gota d’água com o que foi realizado por Rajoy em 2012: a imposição de um teto de gastos públicos, uma reforma trabalhista e do sistema de aposentadorias.

O próprio Temer está em uma situação ainda mais delicada que a de seu convidado após o promotor geral da República o situar no centro do esquema de corrupção que arrecadava comissões para financiar seu partido, o PMDB, e somente a imunidade presidencial o livra por enquanto de ser investigado pela Justiça como seus cinco antecessores no cargo. O consolo de Temer, como o de Rajoy, é que seus adversários políticos não estão melhor, já que o caso Lava Jato, uma gigantesca rede de subornos com ramificações na Petrobras e Odebrecht, colocou em descrédito toda a classe política brasileira.

O Governo de Temer editou um vídeo para propagandear a visita de Rajoy. E não é para menos. Desde que sucedeu à sua parceira de cédula eleitoral, Dilma Rousseff, com um impeachment mais do que polêmico em maio, somente o presidente argentino, Mauricio Macri, e o português, Marcelo Rebelo de Sousa, visitaram oficialmente o Brasil. O papa Francisco declinou diplomaticamente um convite para viajar nesse ano.

A visita de Rajoy servirá a Temer para tentar responder às críticas sobre sua pequena importância internacional e rentabilizar os primeiros sinais de recuperação econômica após a recessão que afeta duramente a economia brasileira desde 2014. Mas Temer tem pouco tempo – seu mandato termina em dezembro de 2018 e por enquanto sua reeleição sequer é aventada por seu diminuto índice de popularidade – de modo que precisa de resultados a curto prazo que cheguem aos setores da sociedade mais castigados pela crise.

O presidente brasileiro colocou em andamento um programa de concessões e privatizações em serviços públicos como a eletricidade e os aeroportos, que se propõe a ampliar a outros 34 setores, e prometeu segurança jurídica e menos trâmites burocráticos para atrair investidores estrangeiros.

Rajoy, que nunca teve bom relacionamento com Dilma Rousseff e só visitou o Brasil em junho de 2012 para participar da conferência sobre mudança climática no Rio de Janeiro, aposta tudo em Temer, com quem foi um dos primeiros líderes internacionais a se reunir, durante a reunião do G-20 em Hangzhou (China) em setembro. E se transformou em seu maior aliado na Europa para tentar fechar o quanto antes um acordo de livre comércio entre a UE e o Mercosul emperrado até o ano passado. É preciso ver se a relação estratégica que agora pretende recuperar perderá a dependência da sintonia entre os inquilinos dos palácios do Planalto e La Moncloa. O projeto do futuro cabo submarino de fibra ótica entre os dois países, que Rajoy lançará em São Paulo, deverá simbolizar uma vontade de continuidade além dos vaivéns políticos.